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Drills de Segurança em Cruzeiros: Tudo o Que Você Precisa Saber
Saiba tudo sobre drills de segurança em cruzeiros: muster drill, e-muster e como passageiros e tripulação se preparam para emergências a bordo dos navios de cruzeiro.
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Por: Elisa Magalhães
Por que os Drills São Obrigatórios
Antes de falar do muster drill em si, é importante entender por que esses exercícios existem. Nenhum navio de cruzeiro pode operar sem cumprir normas internacionais de segurança, e elas são levadas muito a sério pela indústria marítima. A segurança a bordo de um navio de passageiros é regida por convenções internacionais que vêm sendo atualizadas desde o início do século XX. A principal delas é a SOLAS (Safety of Life at Sea), criada em 1914 após o naufrágio do Titanic, e que até hoje define padrões para a vida no mar.
Entre suas determinações está a obrigatoriedade de exercícios regulares para tripulação e passageiros. Essas práticas não são apenas protocolos burocráticos: elas têm como objetivo preparar todos para situações de emergência, garantindo que tanto os tripulantes quanto os viajantes saibam como agir diante de cenários como incêndios, evacuações ou o uso dos equipamentos de salvatagem.
De acordo com a legislação marítima internacional:
Drills semanais de incêndio e abandono do navio são realizados pela tripulação.
Todos os tripulantes precisam participar ao menos uma vez por mês de cada tipo de exercício.
O exercício para passageiros (muster drill) deve ocorrer antes da partida do navio, no máximo, em até algumas horas após o embarque.
Outros treinamentos específicos — como fechamento de portas estanques, combate a incêndio em espaços confinados ou lançamento de botes — são feitos em diferentes frequências e sempre registrados no diário de bordo.
O conjunto dessas normas garante que a segurança não dependa apenas de tecnologia ou infraestrutura, mas principalmente da preparação humana.


O Que é o Muster Drill
Se você já embarcou em um cruzeiro, certamente ouviu falar do “muster drill”. Ele pode parecer apenas mais uma formalidade, mas na prática é o coração do sistema de segurança a bordo.
O muster drill é o exercício obrigatório realizado no início de cada viagem. Seu objetivo é familiarizar passageiros e tripulantes com o local de reunião em caso de emergência (muster station), ensinar o uso correto do colete salva-vidas e reforçar as rotas de evacuação.
Durante o drill, o alarme geral de emergência é acionado: sete sinais curtos seguidos de um longo, emitidos pela buzina ou apito do navio. Esse som é universal e reconhecido em todo o mundo marítimo. Assim que ele toca, passageiros devem seguir em silêncio até a estação designada, onde recebem instruções claras e diretas sobre:
uso correto do colete,
rotas de fuga,
localização dos botes salva-vidas,
comportamento esperado em uma evacuação real.
Essa familiarização é essencial. Em uma emergência, segundos podem fazer diferença, e um passageiro que sabe exatamente para onde ir não só se protege melhor como contribui para o fluxo coletivo.


Onde Ficam as Muster Stations no Navio
Nos navios médios, com capacidade até cerca de 2.500 passageiros — realidade que conheci de perto — as muster stations costumam ser áreas públicas internas: o teatro principal, pubs maiores ou outros salões que permitam reunir grupos grandes de forma organizada. Esses espaços têm a vantagem de manter os passageiros abrigados, independentemente do clima no exterior, e ainda facilitam o controle feito pela tripulação.
Já nos mega-navios modernos, que ultrapassam facilmente os 4.000 hóspedes, é cada vez mais comum que as muster stations estejam localizadas diretamente no deck dos botes salva-vidas. Isso reduz etapas em caso de evacuação real: os passageiros já estariam posicionados no mesmo nível das embarcações de emergência, prontos para embarcar se fosse decretada a ordem.
Essa divisão não é aleatória. Ela segue as diretrizes da IMO (International Maritime Organization), que estabelece normas globais de segurança marítima. A organização determina que cada cabine tenha uma muster station designada, com capacidade proporcional e sinalização clara, garantindo que todos consigam chegar ao ponto de reunião em tempo seguro.
Na prática, você encontra a informação da sua muster station no cartão-chave da cabine e também afixada na parte de trás da porta do quarto. Durante o drill, a tripulação reforça essa divisão e orienta cada passageiro até o local correto.
Saber onde fica sua muster station é tão importante quanto lembrar o número da cabine: em uma emergência, é ali que sua segurança e organização estarão asseguradas.


Após o Costa Concordia: Mudanças nas Regras
O naufrágio do Costa Concordia, em janeiro de 2012, não apenas marcou a história dos cruzeiros, mas também redefiniu protocolos de segurança. A tragédia expôs falhas graves: muitos passageiros não haviam participado de drills e sequer sabiam onde estavam os botes salva-vidas.
Até então, algumas companhias realizavam o muster drill até 24 horas depois da partida, o que significava que passageiros que embarcavam em portos intermediários poderiam navegar sem treinamento imediato. Após a tragédia, isso mudou. Hoje, a regra é clara: todos os navios de cruzeiro devem realizar o drill antes de deixar o porto inicial da viagem.
Essa atualização, reforçada pela IMO e aceita globalmente, não foi apenas uma mudança de norma, mas um alerta de que a preparação imediata é vital. A indústria reagiu rápido, e atualmente nenhum comandante inicia a viagem sem confirmar a realização do drill para todos a bordo.
Logo no início da minha vida no mar, um belo dia encontramos o Costa Concordia em porto. Ao preparar este artigo, reencontrei essa foto entre outras — uma memória que ainda hoje lembra da fragilidade da vida no mar e da força silenciosa que cada tragédia deixa em quem navega.


Como o Drill Funciona na Prática
Na hora do embarque, muitos passageiros ficam curiosos ou até ansiosos sobre como será o drill. A dinâmica varia um pouco conforme a companhia e o navio, mas segue um padrão internacionalmente reconhecido.
O anúncio pelo sistema de som informa que o exercício vai começar. Em seguida, soa o alarme geral — sete curtos e um longo. Os passageiros, então, devem seguir até a muster station, indicada no cartão-chave ou na porta da cabine.
Chegando ao local, recebem instruções e uma demonstração prática sobre o uso do colete salva-vidas. É nesse momento que a tripulação também explica o procedimento de abandono e reforça pontos de comportamento: manter silêncio, não correr, ajudar crianças e pessoas com mobilidade reduzida.
Após a instrução, há uma checagem de presença. Os tripulantes utilizam leitores de cartões ou listas manuais para confirmar que todos compareceram. Por fim, o exercício é encerrado oficialmente, geralmente com uma breve fala do comandante ou de um oficial responsável.
A duração pode variar. Em navios menores, o drill leva pouco mais de 20 minutos. Em megaships com milhares de passageiros, pode passar dos 40 minutos e chegar até 1 hora. Mas há um ponto inegociável: em uma situação real, a evacuação completa precisa ocorrer em até 30 minutos — exigência estabelecida pela IMO.


Do Tradicional ao Digital: O E-Muster Drill
Quem já navegava antes da pandemia lembra bem dos drills tradicionais: multidões reunidas em decks sob sol forte, passageiros espremidos em salões lotados, serviços suspensos e filas demoradas no dia do embarque. Essa cena, que era comum por décadas, mudou radicalmente com a chegada do e-muster drill.
A inovação foi patenteada pela Royal Caribbean em 2020, em plena pandemia de COVID-19, como forma de reduzir aglomerações. Logo depois, outras companhias passaram a adotar versões semelhantes.
No e-muster, o briefing inicial acontece de forma digital. O passageiro assiste a um vídeo de segurança — seja pela TV da cabine, ou pelo aplicativo da companhia — e ouve o som do alarme. Em seguida, em qualquer momento antes da partida, deve comparecer à sua muster station para confirmar presença com um tripulante, que escaneia o cartão.
Esse formato trouxe vantagens claras para os passageiros. Houve mais flexibilidade para concluir o drill no próprio ritmo, sem depender de grandes movimentações coletivas. As filas e aglomerações típicas do procedimento tradicional foram eliminadas, e a compreensão individual do conteúdo passou a ser maior, já que cada pessoa pôde acompanhar as instruções de forma mais direta e sem distrações.
As companhias que já implementaram incluem não apenas todo o Royal Caribbean Group (Royal Caribbean International, Celebrity Cruises, Azamara, Silversea), mas também parceiros licenciados como Norwegian, Oceania, Regent Seven Seas, e até a Carnival, que desenvolveu seu próprio sistema de self-mustering.


E-Muster: Conexão Grátis Para Cumprir o Drill
Uma das dúvidas mais comuns entre os cruzeiristas é se o uso do aplicativo para o e-muster exige contratar internet a bordo. A resposta é não.
As companhias oferecem uma conexão Wi-Fi interna e gratuita, exclusiva para funções básicas do aplicativo e para o acesso ao conteúdo de segurança. Isso significa que você não precisa comprar pacote de internet para fazer o drill. O sistema funciona até mesmo em modo avião, desde que o celular esteja conectado ao Wi-Fi do navio.
A rede, no entanto, é limitada apenas às funções do app e não permite navegação livre. Essa solução prática evita custos extras e assegura que todos possam cumprir a exigência sem complicações.
Quer entender como funciona o Wi-Fi a bordo e aproveitar sua conexão durante a viagem? Confira nesse artigo completo sobre internet nos navios e navegue informado e conectado.


Consequências de Não Participar
Por mais que pareça um detalhe, não participar do drill não é tolerado em nenhuma circunstância. A segurança coletiva está em jogo, e a responsabilidade é compartilhada entre tripulação e passageiros.
Quem não comparece é localizado e obrigado a concluir o exercício. Se insistir em não participar, pode ter o cartão de bordo bloqueado, o que impede o uso de serviços a bordo. Em casos extremos, a companhia pode até desembarcar o passageiro sem reembolso.
Mesmo aqueles que embarcam em portos intermediários, após o drill inicial, recebem um briefing individual ou em pequenos grupos para garantir que todos, sem exceção, sejam instruídos.


Como a Tripulação se Prepara para o Drill de Passageiros
Antes mesmo de os passageiros embarcarem, a tripulação já está totalmente envolvida na preparação do drill. Cada novo embarque significa um novo muster drill, e todo tripulante que chega junto com os passageiros deve se familiarizar imediatamente com os procedimentos. Nenhum detalhe é deixado ao acaso: todos precisam conhecer as rotas, os equipamentos e a organização da muster station para garantir que, no momento do exercício, cada passo seja seguro e eficiente.
O drill de passageiros envolve múltiplos departamentos a bordo — recepção, governança, segurança, engenharia, operações de entretenimento e alimentação. Cada equipe sabe exatamente qual é sua função e como colaborar para conduzir os passageiros de forma ordenada.
Além disso, existe o drill da própria tripulação, que muitas vezes os passageiros gostam de acompanhar, especialmente em cruzeiros de vários dias. Esse exercício ocorre logo após o desembarque dos passageiros em um porto de escala e faz parte do plano de treinamento contínuo do navio. Nenhum tripulante é autorizado a deixar a embarcação antes da conclusão desse drill, garantindo que toda a equipe esteja alinhada com os procedimentos de emergência. Em alguns casos, alguns cruzeiristas permanecem a bordo apenas para presenciar e aprender com a execução desses treinamentos.
Durante meus anos no mar, eu mesma participei de inúmeros drills. Confesso que, em alguns momentos, podia ser cansativo, longo ou até significar perder a chance de visitar um porto — mas ainda assim eu gostava. Era uma oportunidade real de aprender e de observar como, a bordo, não importa o cargo: em uma situação de emergência todos exercem a mesma função essencial, que é garantir a segurança coletiva.


Quais Tipos de Drills os Passageiros Podem Acompanhar
Em cruzeiros mais longos, há momentos em que passageiros têm a oportunidade de observar alguns drills da tripulação. Essa experiência oferece um olhar exclusivo sobre como a equipe mantém a segurança a bordo, mas é importante lembrar que nem todos os exercícios estão disponíveis para passageiros, e a liberação depende da logística do navio e da política da companhia.
Alguns drills que, em certos casos, podem ser acompanhados pelos passageiros incluem:
Fogo (Fire Drill): simula incêndios em áreas públicas ou técnicas do navio. A tripulação treina contenção, uso de extintores e comunicação entre departamentos.
Homem ao Mar (Man Overboard Drill): procedimentos de resgate de uma pessoa que caiu ao mar, envolvendo coordenação entre ponte, deck e serviços de apoio.
Medical Drill: exercícios médicos envolvendo a equipe do hospital, muitas vezes integrando outros departamentos para simular emergências reais de passageiros ou tripulantes.
Evacuação Parcial: algumas companhias permitem que passageiros observem exercícios de abandono parcial, simulando evacuação de uma seção do navio, sem interromper a operação normal.
Esses drills normalmente não passam de uma hora de duração, permitindo que passageiros vejam a operação sem comprometer a programação do navio.
Existem outros exercícios mais restritos, como manobras complexas de tender, drills na casa de máquinas ou testes de sistemas críticos na ponte, que são exclusivos para altos cargos da tripulação e não podem ser observados por passageiros por questões de segurança.
Um detalhe elegante e importante: quando qualquer alarme é acionado durante esses exercícios, a ponte comunica claramente que trata-se apenas de um exercício, garantindo que todos saibam que não há emergência real, mas ainda assim possam acompanhar os protocolos sendo aplicados.


Considerações Finais
Mais do que uma formalidade, o muster drill é um pacto silencioso entre tripulação e passageiros. É nele que todos aprendem a agir juntos caso o inesperado aconteça.
Sabemos que, depois de horas lidando com voos, embarques e filas nos portos, o passageiro só quer descansar. Mas, como vimos no artigo, o drill garante que você estará familiarizado com os protocolos do navio caso ocorra qualquer emergência. Ao ouvir os sete apitos curtos e um longo, é hora de pegar seus itens de emergência — medicamentos, telefone, colete — e seguir para sua muster station.
É importante lembrar que crianças também participam do drill, geralmente acompanhadas pelos pais ou responsáveis. A idade mínima e as orientações variam conforme a companhia, mas a responsabilidade pela familiarização é sempre da família. Além disso, muitas pessoas subestimam o simples ato de colocar o colete salva-vidas, mas, na prática, nem todos conseguem colocá-lo corretamente sem orientação. Por isso, a presença e atenção durante o drill são essenciais.
Ao longo da jornada a bordo, a única emergência real que nunca vivi foi uma evacuação completa do navio. Enfrentamos incêndios — felizmente, muitas vezes pequenos e contidos com sucesso pela tripulação, casos de homem ao mar e inúmeras emergências médicas graves, algumas com resultados sérios. Nem sempre os passageiros têm total ciência do que ocorreu, mas para quem está a bordo, esses momentos reforçam a importância de cada drill e treinamento.
Participar desse momento, seja no formato tradicional ou digital, é entender que cada detalhe a bordo desde o alarme aos procedimentos de evacuação — é pensado para proteger vidas e garantir que a viagem seja lembrada pelos bons momentos, e não pelos imprevistos.
Obrigada por me acompanhar neste post. Safe sailings e até a próxima aventura a bordo!
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Entre empolgação, cansaço e responsabilidade: drill concluído a bordo e em porto, uma lembrança viva da rotina e da dedicação de cada tripulante.

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